fugindo ao ruído viscoso do fumo e sol vadio
que os homens teimam impor-me.
Vê na calma deste rio
O sossego a correr
Saboreando o estio
Não tem pressa de morrer
A foz é seu destino
Há milénios que o faz
Mas ao contrário de ti
Vai correndo como lhe apraz
Na calçada da tua vida
Terás uma foz como certeza
Tenhas ou não maior destreza
Enquanto passas pelas margens
Desfruta das suas paisagens
E conforme elas convidam
Faz do teu caminho um hino
Como se ainda fosses menino.
Manuela Barroso
Imagem- Pixbay
Boas Férias, Agosto!
Explode mês de Maio! E como te chamas, flor? |
Manuela Barroso ( reeditado)
Abril de Abril
Era um Abril de amigo Abril de trigo
Abril de trevo e trégua e vinho e húmus
Abril de novos ritmos novos rumos.
Era um Abril comigo Abril contigo
ainda só ardor e sem ardil
Abril sem adjectivo Abril de Abril.
Era um Abril na praça Abril de massas
era um Abril na rua Abril a rodos
Abril de sol que nasce para todos.
Abril de vinho e sonho em nossas taças
era um Abril de clava Abril em acto
em mil novecentos e setenta e quatro.
Era um Abril viril Abril tão bravo
Abril de boca a abrir-se Abril palavra
esse Abril em que Abril se libertava.
Era um Abril de clava Abril de cravo
Abril de mão na mão e sem fantasmas
esse Abril em que Abril floriu nas armas.
Manuel Alegre
do livro "Atlântico" 1981
Abril de Sim Abril de Não
Eu vi Abril por fora e Abril por dentro
vi o Abril que foi e Abril de agora
eu vi Abril em festa e Abril lamento
Abril como quem ri como quem chora.
Eu vi chorar Abril e Abril partir
vi o Abril de sim e Abril de não
Abril que já não é Abril por vir
e como tudo o mais contradição.
Vi o Abril que ganha e Abril que perde
Abril que foi Abril e o que não foi
eu vi Abril de ser e de não ser.
Abril de Abril vestido (Abril tão verde)
Abril de Abril despido (Abril que dói)
Abril já feito. E ainda por fazer.
Manuel Alegre
30 Anos de Poesia
Publicações Dom Quixote
Jorge de Sena
(1919-1978)
FLOR SILVESTRE
Desejaste um campo de poemas
na flor da noite.
Acompanham-te sombras de ardósias
e açúcares de lua.
No abismo do sono, colhes rosas negras
na alegria da noite
e na sonolência dos astros dormes
o abandono do teu corpo.
Descobres um veleiro em viagens submersas
e rumas ao sul de todas as poeiras
para encontrares o poema da vida
mesmo nas correntes mais adversas.
manuela barroso, "Luminescências"
cerejeiras em flor |
Manuela Barroso, "Luminescências"
Eis retratos de Vida...
...Flores que teimam nascer, crescer no meio do pântano.
O odor nauseabundo e putrefacto de água contaminada vinda do mais recatado e esconso canto não as amedronta...
...E florescem num desafio ao belo e ao horrível...
...E a cor desafia as borbulhas enquistadas que se soltam do ventre das águas...
...E o encanto permanece lá, no amarelo... e a flor é igual a ela própria: Linda!
Não perdeu, nem brilho, nem encanto, nem cor, nem admiração!
Tornou-se mais ela, mais flor...
E...Flores e... as flores teimam em florir nos charcos podres, numa espécie de purificação.
Vida ou morte...desejo ou ambição...guerra ou paz...
Olhasse a Humanidade para os lírios dos charcos e vissem neles o antagonismo entre a graça e os desgraçados , a beleza e a presa.
Ah! maravilhoso e enigmático mundo este!..Cada vez que os ouço, mais admiro o seu carácter, o seu instinto protector, a sua altivez sadia |
...
Texto: manuela barroso